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Quando usar a linguagem não-verbal na educação de crianças

Quando usar a linguagem não-verbal na educação de crianças

A importância da imitação na aprendizagem infantil

Nós, pessoas adultas, tendemos a construir a nossa aprendizagem com base na linguagem verbal. Isso porque estamos sempre pensando, planejando, traçando estratégias e nos antecipando às situações. Logo após vivenciar experiências, somos capazes de avaliá-las, julgando, mensurando e qualificando-as de diversas maneiras. A partir da sequência planejamento – ação – avaliação – novo planejamento, realizamos o que chamamos de aprendizagem e desenvolvimento. Podemos imaginar o quanto essa elaboração mental exige da nossa linguagem. Precisamos de vocabulário para organizar este complexo sistema simbólico e conhecer as estruturas gramaticais e sintáticas da língua. Somente assim podemos formar um todo coerente de pensamento que permite este aprendizado baseado na abstração.

Agora vamos pensar em bebês e crianças muito pequenas, de, por exemplo, dois anos de idade. Elas, obviamente não possuem a linguagem verbal amadurecida. Elas têm ainda pouco vocabulário, não dominaram as estruturas linguísticas e nem sequer descobriram ainda todos os fonemas da língua materna. Sendo assim, o sistema de aprendizado puramente racional e abstrato exemplificado no parágrafo anterior se torna impossível, não é mesmo? Entretanto, seria equivocado afirmar que crianças de dois anos não aprendem. É sobre isso que vim falar hoje. Vamos procurar compreender como se dá esta aprendizagem não-verbal infantil e descobrir as melhores maneiras de auxiliar as crianças em sua aprendizagem.

Para alcançarmos o nosso objetivo, o texto de hoje se organizará nas seguintes partes:

  1. Como a criança pequena aprende;
  2. Qual é o papel do educador na aprendizagem infantil; e
  3. Por que utilizar a imitação nos processos de ensino e aprendizagem.

Como a criança pequena aprende

Segundo Piaget (1896-1980), as crianças passam por 4 estágios de desenvolvimento ao longo da vida. São eles:

  1. Sensório motor (do nascimento aos 2 anos de idade); 
  2. Pré-operacional (dos 2 aos 7 anos);
  3. Operacional concreto (7 aos 12 anos);
  4. Operacional formal (A partir dos 12 anos).
Hoje, nós vamos focar no estágio 1, ou seja, no período sensório motor da aprendizagem.  Durante esta fase, a criança não aprende seguindo uma cadeia lógica de sistemas de inteligência conceitual nem há, como já dito, a predominância da linguagem verbal.  A aprendizagem se dá através da dominância sensorial perceptiva e da pouca abstração (BYINGTON, 2011). No desenvolvimento humano, a fase inicial é de extrema importância, pois, durante o amadurecimento, as formações iniciais contribuem para a aquisição de novas destrezas e, portanto, são necessárias ao alcance dos estágios posteriores.  Há de se considerar que é apenas no nível operacional formal que o indivíduo  adquire todo o potencial para pensar em termos abstratos, construindo hipóteses e testando-as de maneira crítica.  Sendo assim, é importante que o educador tenha a clareza de que o pensamento abstrato não é o que leva uma criança a aprender.

O que impulsiona a aprendizagem infantil são as experiências vividas pela criança, através das quais ela se relaciona com outras pessoas, objetos, espaços, seres e fenômenos da natureza, sentimentos, necessidades, desejos, dores e prazeres, em que pode imaginar, fantasiar e se projetar para que, por livre iniciativa, possa criar, se expressar, se comunicar, ensinar e aprender.  Nestas vivências, que são as brincadeiras, as crianças tiram informações do mundo através das suas sensações e percepções e interagem através das suas ações corporais. Neste contexto espontâneo, relacional e físico, o afeto, o conforto e a segurança são fundamentais para que a criança esteja autoconfiante e exerça a sua aprendizagem com autonomia. 

brincadeira

Qual é o papel do educador na aprendizagem infantil

Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua produção ou a sua construção."

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A partir do claro entendimento da forma pela qual se dá aprendizagem infantil, podemos começar a compreender qual seria o nosso lugar de pessoas adultas e educadoras na vida das crianças.

Primeiramente, se quisermos nos comunicar bem com elas, temos que aprender a falar menos. Entretanto, isso não significa que devemos nos expressar menos, pelo contrário, é indicado usar e abusar de gestos, faces, posturas, modulações vocais, ou seja, dar atenção maior à nossa expressão corporal. Precisamos compreender que as crianças, por serem menos racionais, têm a intuição e a emoção como seus principais guias na interpretação das mensagens que recebem. Elas são sensíveis e, por isso, percebem o que a palavra não diz. Dessa forma, é fundamental que tenhamos cuidado para que a nossa comunicação seja sempre pautada pelo carinho e afeto. 

Nós, como responsáveis pela integridade física dos pequenos, devemos cuidar dos ambientes educativos para que sejam seguros, ricos de estímulos e favoráveis à exploração livre e à manifestação da criatividade. Temos a tarefa de oferecer toda sorte de materiais, tecnologias, espaços, artes, animais, plantas, comidas, cheiros, sabores, texturas, temperaturas, cores, sons, mídias e muito mais do que temos ao nosso alcance, para que a criança possa experimentar, usar,  modelar, montar, desmontar, comer, sentir, ouvir, dançar, correr, chacoalhar, enfim… vivenciar. 

Finalmente, devemos oferecer a possibilidade de socialização às nossas crianças para que suas descobertas sejam compartilhadas e marcadas em sua memória pelo afeto. As interações sociais com outras crianças, adultos, bebês, idosos, pessoas de diversas raças, tribos e modos de vida integram a criança na sociedade, permitindo que ela desenvolva senso de comunidade, percepção da própria identidade, respeito às diferenças, acolhimento do outro, senso de autocuidado e hábitos saudáveis, o que vai culminar em valores profundos como empatia e generosidade.  A relação com outras pessoas irá permitir o início da aquisição da linguagem verbal que, de maneira natural, irá se aprofundar até que amadureça quando chegar lá no nível 4 de Piaget, o Operacional Formal.

Por que utilizar a imitação nos processos de ensino e aprendizagem

Agora que já entendemos como a criança pequena aprende e qual é o papel do educador em sua aprendizagem, vamos falar um pouco sobre metodologia. Existem muitas estratégias que nos auxiliam a conduzir a criança na sua construção de conhecimento e hoje vamos falar um pouco sobre uma muito eficiente: a imitação. 

Conforme compreendemos anteriormente, a linguagem verbal não possui papel preponderante na aprendizagem infantil. O corpo, por sua vez, está em forte evidência neste processo. Sendo assim, a expressão corporal, os gestos, os movimentos e os toques se tornam uma fonte inesgotável de aprendizado que ocorre no contexto das experiências e brincadeiras. São nelas que as crianças adquirem e constroem todo o seu conhecimento. Cabe então, a reflexão:  Como a pessoa adulta deve se comportar durante estas vivências a fim de favorecer esta aprendizagem?

Precisamos compreender, antes de mais nada, que a criança considera os adultos, principalmente seus responsáveis (que lhes dão comida, segurança e conforto), como suas principais referências. Dessa maneira, a criança tem em seus cuidadores, um forte senso de identificação. Elas tendem a imitar seus comportamentos, mesmo que eles não “façam sentido” para ela. Por exemplo, bebês ainda muito pequenos passam os dedos em telas de celulares de maneira típica, mesmo que não entendam o porquê de estarem fazendo isso. Assim, a criança incorpora as condutas socioculturais e passa a reproduzi-las, por se identificar com seus pais.

Levando o que foi dito em consideração, não é difícil perceber que  a criança aprende enquanto imita os adultos, principalmente os que participam dos seus cuidados diários. Sendo assim, quando oferecemos uma atividade educativa em que a criança irá explorar algum material, por exemplo, muito mais coerente do que orientar com palavras e explicações, é simplesmente fazer o que deve ser feito. A criança, inicialmente, irá focar a sua atenção no material, procurando compreendê-lo. Em seguida, observará o adulto fazendo uso do mesmo objeto até que, finalmente, passará a utilizar a ferramenta da mesma maneira que o adulto. 

No nosso trabalho, quando estamos em uma das nossas aulas de Educação Musical Infantil, nós oferecemos, por exemplo, os pandeiros. Enquanto nós, professores, tocamos o nosso pandeiro, cada criança pode explorar livremente o seu. Primeiro, ela vai virar o pandeiro de todos os lados, colocá-lo na boca, colocar pequenos objetos em seu interior, utilizá-lo como um chapéu, etc… tudo isso é muito bom, pois é o impulso de investigação em que a criança percebe as características do objeto e testa suas possibilidades de uso, desenvolvendo suas capacidades perceptivas e a criatividade. Quando este movimento se esgota, a criança olhará para o seu  professor ou professora e perceberá como aquela pessoa utiliza o pandeiro. Eis que, depois de um tempo, nosso aluno passa a desenvolver suas primeiras técnicas instrumentais. Esta conquista pode levar várias aulas… não é necessário pressa,  porque a gente sabe que, ao longo do processo, a criança estará sempre aprendendo. 

Observe o vídeo acima. Nele, está representada a primeira fase da exploração, em que a criança percebe e experimenta o material criativamente antes de iniciar a imitação.

Conclusão

Hoje compreendemos que a linguagem verbal não é preponderante na aprendizagem infantil e que a criança pequena aprende através das experiências diversificadas a que tem acesso. Percebemos também que o papel do educador é proporcionar toda sorte de vivências em que as criança poderá construir seus conhecimentos e iniciar seu processo de socialização. Neste contexto, entendemos que a criança tem, nos adultos que cuidam dela, suas principais referências e, por isso, imitam os seus comportamentos. 

Tendo tudo isso em vista, compreendemos que uma das maneiras mais eficazes de ensinar as crianças é através do próprio exemplo e que, ao invés de orientar com comandos verbais, que as crianças muitas vezes não irão compreender, é muito mais promissor simplesmente executar a ação que se deseja ensinar e permitir que a criança imite, o que, naturalmente irá acontecer.

Bibliografia

BYINGTON, Carlos Amadeu Botelho. A construção amorosa do saber: o fundamento e a finalidade da Pedagogia Simbólica Junguiana. São Paulo: Linear B, 2011.

FREIRE, Paulo . Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2004.

SCHIRMANN, J.K, MIRANDA, N.G, V.F., & ZARTH, E.L.F. Fases de desenvolvimento humano segundo Jean Piaget.

Flávia produtora

Flávia Cappelletti

Fundadora d'a casa do som

Professora de música, gestora educacional e diretora d’ A Casa do Som. Criadora da metodologia de ensino utilizada nas aulas de música da escola..

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